O Quarto do Pânico
“Tom & Jerry” com humanos
Por Luiz Joaquim | 05.04.2018 (quinta-feira)
— crítica originalmente publicada em 7 de junho de 2002
Impossível deixar de observar a competência e a genialidade empregada nos créditos de abertura de O Quarto do Pânico (Panic Room, EUA, 2002), de David Fincher. Em eficaz trabalho digital, nome do elenco e equipe técnica aparecem suspensos no céu de Manhattan, sugando imediatamente o espectador para dentro da atmosfera tensa que está por vir. Genial por que? Pela simplicidade e eficiência da idéia; idéia que possui referência em trabalhos de Saul Bass, colaborador de Hitchcock.
Confrontando O Quarto… com outros destaque de Fincher (Se7en e Clube da Luta) fica a impressão que é esta última produção a que recebeu menos passagens imaginosas em seu roteiro (escrito por David Koepp). O enredo se resume a um Tom & Jerry com humanos. O rato é Meg (Jodie Foster) e sua filha Sarah (Kristen Stewart). A toca delas é um quarto blindado onde se refugiam na primeira noite que habitam a nova casa. Os gatos, ou gatunos, são três assaltantes (Forest Whiteker, Jared Leto e Dwight Yoakam) que estão ali justamente para pegar um tesouro dentro do quarto.
Mediante a ausência de uma história forte, o resultado final do filme revela uma fragilidade do diretor: abusar de travelling – todos ‘impuros’, pois são sustentados por manipulação digital. A estratégia é simples. Utilizar-se de mirabolantes movimentos de câmera para maquiar a falta do que dizer. A câmera chama a atenção para si enquanto esquecemos o essencial. Por essas iniciativas, e pela situações tensas, Fincher tem sido comparado a Brian De Palma, o que configura um equívoco, pois o diretor de Olhos de Serpente (também escrito por Koepp) utiliza-se de travelling com sentido, com razão de ser, como recurso de linguagem na narrativa. Basta lembrar do belo giro de 360 graus em Um Tiro na Noite (1981), expondo a ansiedade de John Travolta. Outro exemplo clássico é a lúdica seqüência final de Profissão: Repórter (1975), de Antonioni.
Afora os excessos, Fincher tem como mérito conduzir seu Quarto… com leveza (más línguas o chamam de Esqueceram de Mim para adultos) e humor (os bandidos fazem constantes referências cinematográficas em seus diálogos) fazendo seus 112 minutos durarem menos do parece. E, aproveitando a estrutura “o público sabe mais que o personagem” no roteiro, o diretor nos brinda com dois ou três momentos de agonia legítimos, suscitando um sentimento próprio a época de Copa do Mundo: o de colar na poltrona e torcer, neste caso, para a heroína e sua filha.
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