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Festivais

22º Cine-PE – Joelho de Porco e Henfil

Dois documentários biográficos redondinhos que dialogam fortemente entre si

Por Luiz Joaquim | 05.06.2018 (terça-feira)

A reunião dos dois documentários que encerrou a competição do 22º Cine-PE: Festival do Audiovisual entre longas-metragens, ontem (4) e no domingo (3) – respectivamente Meu tio e o Joelho de porco, de Rafael Terpins; e Henfil, de Angela Zoé –, reúnem curiosos elos de ligação sendo, o melhor deles, a boa qualidade e inventividade para apresentar dois artistas dos mais criativos, polêmicos e irreverentes da recente história cultural do Brasil. No caso, são eles, Tico Terpins (falecido em 1998), da banda Joelho de porco, e o multiartista Henfil (1944-1988).

Já exibido na Mostra de SP de 2017, Meu tio e o Joelho de porco foi escrito e dirigido por Rafael, sobrinho de Tico, o lider da banda definida como punk (mais pelo escracho performático do que pelo estilo musical). Tico se tornou também uma referência para o então adolescentes Rafael em 1988, quando seu pai faleceu.

Com ele próprio em cena, Rafael vai circulando por São Paulo a bordo de um Ford Landau azul, correndo atrás dos velhos parceiros de Tico na banda (Próspero Albanese, Ricardo Petraglia, entre outros), ao mesmo tempo em que um fantoche animado – representando seu tio – questiona (como bom provocador que era Tico) as próprias informações que o documentário dá aos espectadores pela voz de seus entrevistados.

Um dos maiores méritos de um bom documentário biográfico é imprimir em si mesmo o espírito de seu  protagonista. Neste caso e no de Henfil, os resultados não podiam ser melhor.

Escutar (ou descobrir) os sucessos d’O joelho de porco (como Maldito fiapo de manga e Aeroporto de Congonhas) pelo filme, enquanto conhecemos as presepadas de Tico a frente do grupo, intercalado por imagens de arquivos com apresentações dos músicos é absolutamente revigorante, tanto do ponto de vista musical quanto humorístico.

Rafael Terpins apresenta eu “Meu tio e o Joelho de Porco”, no cine São Luiz (Recife)

Ver Meu tio e o joelho de porco dá a nítida sensação de quem foi Tico e faz nos darmos conta de que, mesmo num momento politicamente difícil, como nos anos 1970, era possível ser irreverente e divertir pela provocação inteligente. O filme é um sopro de alegria, hoje, sobre o nosso próprio país, nestes tempos sombrios em que vivemos no último par de anos.

Henfil também funciona redondo na missão de retratar o espírito irriquieto e divertido do jovem cartunista d’O Pasquim, que nos deixou com apenas 44 anos, vítima de contaminação do vírus HIV por transfusão de hemodiálise.

Igualmente permeado por uma animação, o documentário de Zoé, entretanto, guarda para o final a brincadeira proposta pelo filme. A proposta era registrar uma espécie de reality show para a criação de uma animação (em 2D e 3D), cujo enredo seria permeado com personagens eternizados nos cartuns do Henfil: o fradim, a graúna, o bode Orelana, o cangaceiro Zeferino, Ubaldo e até a barata na capa de seu livro Diário de um Cucaracha (1976), sobre a experiência do autor em viver nos EUA entre 1972 e 1975.

A exibição no 22º Cine-PE foi a primeira do filme e deixou um gosto de atualidade muito forte. Na fala dos amigos contemporâneos d’O Pasquim – Jaguar e Ziraldo, entre eles -, sabemos que as provocações de Henfil incomodavam e vez por outra todo mundo da revista era preso pela ditadura, menos o Henfil e o Millôr. “A gente sabia que eles [os militares] se incomodavam, mas iam fazer o que com um cara que se auto-intitulava primo do [general] Figueiredo?”, recorda Jaguar gargalhando.

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