Cidade Baixa
Um filme de amor a três
Por Luiz Joaquim | 11.09.2018 (terça-feira)
– publicado originalmente em 02 de outubro de 2005 no jornal Folha de Pernambuco
Há uma representação da periferia soteropolitana, e do Brasil por extensão, que ilumina Cidade baixa (2005), novo filme do baiano Sérgio Machado (do documentário Onde a terra acaba). O curioso é que as figuras de Karinna (Alice Braga), Naldinho (Lázaro Ramos) e Deco (Wagner Moura) – que formam o triângulo amoroso do enredo – nasceram para figurar como personagens universais. Mas, uma vez que é pela periferia de Salvador e redondezas que eles perambulam, nada mais apropriado que imergi-los no cenário quente e pulsante dos desfavorecidos de dinheiro. Ou seja, um cenário comum aos brasileiros em sua maioria.
A universalidade que Machado aplica aos seus personagens reside na mais enraizada postura humana (o amor e o ódio) que lhes aflora na trama aqui desenhada. Foi por essa consistência criativa, estética interpretativa que Cidade baixa ganhou o título de melhor filme no Festival do Rio, além de ter chamado atenção na mostra Un Certain Regard, em Cannes 2005. Hoje, já caiu nas graças do mercado estrangeiro, com distribuição em diversos países da Europa e nos Estado Unidos.
Na paisagem humana desenhada por Machado, o sexo, que comumente serve de estopim para a trama num filme corriqueiro, se configura aqui inicialmente apenas como uma moeda de troca entre os três protagonistas. Essa representação ganha força na figura de Braga – sobrinha de Sônia Braga, que se entrega com elegância e despudor a sua ‘Karinna’. Ela faz uma prostituta que, involuntariamente, se envolve e perturba a amizade e fidelidade fraternal entre Naldinho e Deco.
O que Machado coloca em jogo aqui não é o tesão, o amor ou a ira – elementos constantes e conflitantes em quase todos os fotogramas de Cidade baixa e na vida real de pessoas saudáveis. O que está em xeque é algo mais sutil, como saber quais os limites entre o certo ou errado, quando o que você ama atrita com o que você deseja desesperadamente. É uma história de amor. A três, por três.
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