Constantine
A aposta de Deus com o Diabo
Por Luiz Joaquim | 03.10.2019 (quinta-feira)
– publicado em 2005 no jornal Folha de Pernambuco
“Aqui é Constantine… John Constantine… seu bundão”, é o que sussurra Keanu Reeves no ouvido de uma menina possuída por um demônio logo no início de “Constantine” (EUA, 2005). O filme é o longa-metragem de estréia do videoclipeiro Francis Lawrence, e a informação que Reeves passa, cheio de chinfra, para a possuída não diz absolutamente nada ao público (exceto por apresentar o personagem). Mas a seqüência reflete todo o resto do filme, ou seja, um enfadonho circo visual, empenhado em mostrar bichos feios vindo do inferno, indisfarçadamente feitos em laboratório de informática, que querem entrar na dimensão dos humanos.
Para tentar convencer o público, Lawrence parece ter subaproveitado a história criada para o quadrinho “Hellblazer”, por Jamie Delano e Garth Ennis, da DC/Vertigo. Suas estratégias narrativas de convencimento para envolver a platéia a respeito desse enredo surreal parecem empurrados à força, goela abaixo, no espectador. “Constantine”, o filme, não seduz (e nem se preocupa em seduzir) o público para trazê-lo ao seu universo irreal, ele simplesmente o violenta e quer fazê-lo acreditar cegamente nas baboseiras que tenta vender como cinema.
Apenas pelo trailer de divulgação, um espectador comentou brincando: “parece uma espécie de Advogado do diabo com Matrix“. O diagnóstico foi preciso. Se por um lado “Constantine” quer vender uma para-filosofia vinculada a universos paralelos, e acoplada a um apuro visualmente pirotécnico como em Matrix, por outro também quer assustar pelo conceito da perdição ou salvação da alma já propagada por O advogado do diabo.
O slogan de “Constantine” diz assim: “E se lhe dissesse que Deus e o Diabo fizeram uma aposta, uma aposta pelas almas de toda humanidade”. Não só pelo slogan, mas por toda a idéia que “Constantine” quer vender (e vende mal), o filme soa como se tivesse sido escrito por uma seita religiosa alucinada que teme o Diabo acima de todas as coisas, inclusive do bom-senso.
Interpretando a caricatura do ceticismo, Keanu Reeves é Constantine. Um sujeito que vai morrer cedo, de câncer no pulmão, e vai para o inferno porque fuma há 20 anos, ou seja, vem cometendo suicídio aos pouquinhos. Constantine já esteve, literalmente, na casa do capeta, e por isso mesmo tenta a todo custo amenizar seu crime com o Divino e assim alcançar o Paraíso. Por isso vive a fazer exorcismo até que resolve ajudar a desvendar o suicídio da irmã gêmea de uma policial (Rachel Weisz) e começa a desconfiar que o coisa-ruim quer mesmo é subir para o plano dos humanos.
Dita a sinopse, percebe-se que enredo poderia render um bom exemplar cinematográfico ilustrando questões eternas do universo católico como a culpa ou os dogmas da igreja, ou ainda a essência da maldade e da bondade. Mas… visto o filme…
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