Exterminador do Futuro: Destino Sombrio
Exterminador de xenofobia e de misoginia: Vigor físico e intelectual fazem deste um destaque da franquia
Por Felipe Berardo | 31.10.2019 (quinta-feira)
Na lógica da indústria cinematográfica vigente hoje, baseada em franquias e propriedades intelectuais sendo utilizadas e reutilizadas para criar novos blockbusters, Exterminador do futuro; Destino sombrio (Terminator: Dark fate, EUA, 2019) parece surgir como outra proposta segura, aparentemente criada a partir de artifícios já definidos como bem sucedidos por obras em condições similares. Há, no entanto, um interesse em explorar ideias novas aqui, seja renovando o que havia antes de maneiras mais ou menos inesperadas ou abordando questões atuais que ao menos contribuem para a relevância do filme em outros aspectos que não puramente mercadológicos.
O diretor do projeto, Tim Miller (Deadpool), traz esse apelo comercial para o filme na forma de cenas de ação variadas e constantes que, mesmo não sendo particularmente empolgantes ou inventivas, servem no mínimo para manter o ritmo do filme pela incessante formulação de novas situações. Mais interessante, porém, é a proposição do longa em possuir dupla nacionalidade, passando-se durante a primeira metade no México, inclusive mantendo diálogos em apenas espanhol por um período, e usando as atuais relações entre México e EUA como cenário dramático e político. Há um trecho do filme, especificamente, em que as protagonistas precisam atravessar a fronteira ilegalmente e acabam presas num dos centros de detenção impostos pela administração de Donald Trump. É uma sequência de cenas que surpreendentemente consegue balancear muito bem as reverberações políticas pretendidas com uma lógica dramática de filme de ação de alto orçamento sem que nenhum dos dois perca força.
Outra questão política levantada pelo filme é a do empoderamento das mulheres, as personagens femininas aqui são fortes e um conceito básico do filme original, mantido pelas sequências, é reformulado de maneira simples no paralelo entre Sarah Connor e Dani Ramos para apoiar novos valores feministas. Tudo isso, no entanto, surge de forma menos bem sucedida que os comentários acerca da crescente xenofobia e opressão sistêmica de imigrantes nos Estados Unidos por apresentar-se numa lógica demasiadamente enfática e aparentemente satisfeita demais consigo mesmo do que verdadeiramente interessada em refletir e propor discussões relevantes sobre o assunto.
Isso dito, há qualidades relacionadas à essa questão a serem encontradas principalmente nas personagens de Grace e Sarah Connor, interpretadas respectivamente por Mackenzie Davis e Linda Hamilton, que criam personagens fortes e determinadas, ao mesmo tempo que permitem vulnerabilidade, dando espaço à carga dramática. Linda Hamilton tem o peso dos quase 30 anos passados desde sua última aparição importante na franquia em Exterminador do futuro 2: Julgamento final trabalhando a seu favor para construir carga dramática, porém quem mais impressiona é a atriz Mackenzie Davis que possui uma presença física que a permite impor-se com uma organicidade impressionante sobre todas as pessoas com quem contracena, algo que é facilitado pelo jogo de câmeras utilizado para transformar a intérprete de 1,78 metros em quase uma gigante, especialmente quando atuando ao lado das outras duas atrizes que compõem o elenco de protagonistas.
Outra grande presença no filme, fora do elenco feminino, é composta pelo retorno de Arnold Schwarzenegger, cujo personagem também recebe um arco durante a segunda metade do filme em que se vê um distanciamento ainda maior da figura estoica e estritamente funcional mais comumente associada ao personagem. O peso do passar dos anos também ajuda na construção dramática do personagem, assim como com Sarah Connor, e é uma surpresa agradável que o filme tenha tanto interesse por essa continuidade dramática e emocional dos personagens após os eventos passados nos dois primeiros filmes, já que as últimas três produções bem menos aclamadas são quase completamente ignoradas aqui.
Há ainda algo a ser criticado na insistência em manter as preocupações alarmistas relacionadas a avanços tecnológicos de forma tão datada, mesmo esse sendo um conceito tão inerente a série de filmes, usando a mesma exata ideia de revolução das máquinas proposta há 35 anos no Exterminador do futuro em tempos em que Black mirror já explorou mais a fundo as possibilidades dispostas sobre o assunto. Ao fim de tudo, no entanto, essa atenção dada aos personagens clássicos da franquia na figura de Sarah Connor e o Exterminador, junto a algumas dessas novas ideias propostas, tanto políticas quanto dramáticas, acompanhando o que há de desinteressante, são instigantes o bastante para justificar a existência desse novo filme e colocá-lo acima dos últimos três fracassos da franquia.
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