Brennand destrói sua arte no cinema
O artista se veste de “coisa ruim” para simbolizar o censor de sua obra em novo filme de Liz Donovan
Por Luiz Joaquim | 20.12.2019 (sexta-feira)
– publicado originalmente na capa do ‘Caderno C’ do Jornal do Commercio (Recife) em 6 de agosto de 1999 (sexta-feira). Crédito das fotos, Mariana Guerra.
Nasce hoje, às 10h, o mais jovem ator pernambucano. A cineasta Liz Donovanvai dar à luz ao seu quarto filho ao mesmo tempo em que sua equipe de filmagem registra o parto para utilizá-lo no curta-metragem O universo imaginário de Francisco Brennand. O título é provisório, mas a temática é a mesma desse artista internacionalmente reconhecido: a a transformação da matéria envolvendo a criação do mundo.
Brennand não gosta que se faça relações com o erotismo em sua obra – motivo inclusive de toda a polêmica em que está envolvido atualmente, para sua própria contrariedade. Segundo o artista, o que existe nos seus trabalhos em cerâmica é “a carga pesada da força sexual”, e que o erotismo é cultural. Segundo Mário Vargas Llosa, na sexualidade, em sua expressão plástica, há uma certa espiritualidade, e é justamente nessa essência em que irá mergulhar o filme de Liz Donovan.
O ceramista liga sua obra à sexualidade, pois esta serve à procriação e à reprodução. A metáfora dos trabalhos do artista terá sua representação nas imagens do parto da cineasta. “Em todo nascimento há algo de belo e trágico. Há uma violência que está presente em tudo que é orgânico” diz Donovan. Alternando com as cenas do nascimento, o curta vai intercalar imagens microscópicas de organismos vivos e esculturas de Brennand, como a que versa sobre a origem do mundo, com a uma serpente quebrando o ovo que a protege. O filme será “costurado” depoimentos do artista , além de mostrar imagens aéreas do seu atelier.
VETO – Sem esconder sua revolta com a censura que sofreu pela proposta de seu trabalho para compor o projeto Eu vi o mundo… ele começava no Recife – que envolve um parque de esculturas nos arrecifes em frente ao Marco Zero – Brennand revela que vai fazer um manifesto contra o veto que recebeu contra sua torre de 30 metros de altura lembrando uma nave interplanetária. “Irei destruir uma de minhas peças diante das câmeras da equipe de filmagem”, diz o artista. Caracterizado como “o coisa ruim”, usando um sobretudo negro e óculos escuros, Brennand irá simbolizar o censor que não quis se identificar.
O universo imaginário de Francisco Brennand está sendo captado em película (16mm) e vídeo (batacam digital) para depois ser finalizado na bitola 35mm. As filmagens terminam hoje, mas o projeto ainda não tem data de conclusão. Donovan revela que tem encontrado dificuldades para captar recursos financeiros. “Mesmo com a existência da Lei de Incentivo à Cultura algumas empresas desenvolveram mecanismos interno para não apoiar o cinema”, revela a diretora. Por enquanto, o único patrocinador do curta é a BCP Telecomunicações.
Essa mesma questão envolve Tapacurá, um outro projeto da cineasta em parceira com Nelson Caldas Filho. Donovan, que assinou a direção de arte de Clandestina felicidade, diz que está ainda em busca de apoio e aproveita o período para fazer ajustes no roteiro. O filme pretende contar, de forma cômica, os efeitos provocados pelos boatos sobre o rompimento da barragem de Tapacurá em 1975. O filme deve estrear em março. [de 2000]
Nota do editor, 20 de março de 2019:
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