Meu Nome É Dolemite
Groove desafinado
Por Luiz Joaquim | 13.12.2019 (sexta-feira)
Meu nome é Dolemite (Dolemite is My Name, EUA, 2019), produzido pela Netflix, dirigido por Craig Brewer e estrelado por Eddie Murphy parecer ter sua estrutura interna muito próxima daquilo que o enredo apresenta. E ele apresenta Dolemite, ou melhor, Rudy Ray Moore (1927-2008).
No início dos 1970, Rudy (Murphy) já não era nenhum garoto e ainda tentava, de toda maneira, tornar-se uma estrela no show business. Fosse gravando músicas anacrônicas, fosse tentando encaixar seu número de stand up comedy nos parcos cinco minutos que lhe cabiam num pardieiro antes da entrada da atração principal.
Após perceber a graça muito particular das piadas hard-core que velhos mendigos negros contavam nas ruas – como uma espécie de desafio de glosa poética, só que apimentada ao extremo na sacanagem e nas palavras sujas (que, por sua vez, guardam um histórico do tempo da escravidão), Rudy cria seu personagem Dolemite.
Ganha com seu personagem, primeiro, os palcos. Depois, grava alguns álbuns até perceber que cinema seria o verdadeiro barato para chegar ao sucesso nacional. É aí que Meu nome é Dolemite começa a ganhar um pouco de fôlego cômico uma vez que, até então, sofria de, digamos, falta de ar na graça.
É nesse sentido que sua “estrutura interna é muito próxima daquilo que o enredo apresenta” porque Meu nome é Dolemite parecer ser um projeto muito caro a Murphy, que não dirige o filme – assim como Rudy não dirigiu seu primeiro filme Dolemite (1975), no caso, foi assumido por D’Urville Martin (Wesley Snipes), na época conhecido por ter feito uma ponta em O bebê de Rosemary (1968).
E Meu nome… é caro a Murphy uma vez que ele está retratando para uma nova geração o início da trajetória de uma pouco conhecida figura para além do blaxploitation na cultura negra do cinema norte-americano (talvez até mesmo dentro dela).
Com a responsabilidade de apresentar o que há de engraçado e não engraçado (voluntária e não voluntariamente) na desesperada busca de Rudy pelo sucesso, Murphy parece ficar um tanto perdido no meio do caminho.
O eterno ‘tira da pesada’ até encarna essa figura curiosa que é Rudy, mezzo divertida mezzo triste, com muito empenho mas resulta que Meu nome é Dolemite demora a engatar, sem mesmo sabermos se esse engate está forte o suficiente ali na segunda metade do filme.
É como se a canastrice de Rudy como Dolemite (na pele de Murphy) em cena não fosse suficiente para gerar graça necessária. Responsabilidade de Murphy ou de Rudy? Talvez do primeiro, uma vez que vendo Dolemite, o filme de 1975, percebamos o humor saindo autêntico. Com este incomum herói – espécie de Shaft depois da gripe – lutando um karatê picareta para se vingar de polícias corruptos.
Atentar para como Meu nome é Dolemite guarda relações com outro projeto (também muito particular de seu protagonista – James Franco) que chamou a atenção de Hollywood. Era O artista do desastre, sobre a determinação de Tommy Wiseau em realizar e lançar seu modesto e atrapalhado longa-metragem The room (2003).
Atentar também que assim como Rudy encontra a distribuidora Dimension Films para lançar seu Dolemite (1975) comercialmente, dando a chance de o filme fazer sucesso entre a comunidade negra em todo os EUA, Murphy encontrou na Netflix o espaço correto para lançar este filme mediano (e muito dispendioso), conseguindo uma visibilidade que ainda lhe rendeu duas indicações ao 77º Globo de Ouro, como melhor filme cômico e melhor ator para o próprio.
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