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Festivais

44º Annecy (2020) – Sul-americanos

Julio Cavani comenta seis produções da América do Sul que emprestam respeito a esta edição do festival.

Por Luiz Joaquim | 17.06.2020 (quarta-feira)

– acima, imagem do curta-metragem Carne

Seis bons filmes representam a América do Sul em 2020 no Festival de Annecy de cinema de animação, que começou na segunda-feira (15) e continua até o dia 30 excepcionalmente em formato online. O curta-metragem Carne, de Camila Kater, é o representante do Brasil na competição principal de curtas. Outro concorrente na mesma mostra é Purple Boy, que oficialmente é uma produção de Portugal, mas foi dirigido pelo brasileiro Alexandre Siqueira. Coprodução entre Chile e Brasil, o infantil Nahuel e o Livro Mágico, dirigido pelo animador chileno Germán Acuña, participa da competitiva principal de longas-metragens. O longa argentino Lava, de Ayar Blasco, concorre na mostra paralela Contrechamp (Contracampo). A Colômbia está presente com Todo es Culpa de la Sal, de María Cristina Pérez. A Argentina também participa com os curtas Cucaracha, de Agustín Touriño, e Migrante, de Esteban Ezequiel Dalinger e Cesar Daniel Iezzi.

CARNE (Curta-Metragem, Competição Oficial)

 

“Carne”

“Não é fácil ser um corpo”, diz a atriz Helena Ignez em uma cena de Carne. A diretora Camila Kater elabora uma série de imagens com diversos materiais (tinta, massinha, película fílmica, objetos) e técnicas de animação para ilustrar depoimentos reais de mulheres que relatam experiências e sentimentos relacionados a temas como menstruação, obesidade, negritude e menopausa. Com bastante criatividade e liberdade visual, os recursos animados mostram-se perfeitos para expressar nuances do subconsciente, do pensamento e das sensações das personagens. Por ser estruturado por entrevistas verdadeiras, o curta pode inclusive ser classificado como documentário. O filme já ganhou mais de 20 prêmios e tornou-se um dos curtas-metragens brasileiros com a melhor carreira da temporada 2019-2020, com passagens por festivais concorridíssimos, como os de Locarno (Suíça), de Toronto (Canadá) e de Brasília.

PURPLE BOY (Curta-Metragem, Competição Oficial)

“Purple Boy”

Tons de roxo, violeta e rosa predominam em Purple Boy, que expõe a crueldade humana contra identidades sexuais desviantes. As violentas pressões e expectativas sobre as identidades de gênero são retratadas em uma história pontuada por alucinantes imagens de desenho animado 2D, com referências críticas pontuais também a ditaduras policiais latino-americanas. O filme já foi exibido em 2019 no Recife em projeção no Cinema da Fundação, onde venceu o festival Animage.

TODO ES CULPA DE LA SAL (Curta-Metragem, Competição Perspectives)

“Tudo es Culpa de La Sal”

Protagonizado por bichos-preguiça que se comportam como seres humanos e estranham comportamentos animais, o curta colombiano adota a linguagem das fotos dos álbuns de família para contar uma história que ironiza criticamente os valores morais e as crises familiares da classe média. O ponto de vista é de uma filhote fêmea que resgata memórias sobre o pai e os irmãos. Com bastante originalidade técnica, a diretora María Cristina Pérez adota um aspecto visual bidimensional de pintura, com as marcas de pinceladas evidenciadas.

NAHUEL E O LIVRO MÁGICO (Longa-Metragem, Competição Oficial)

“Nahuel e o Livro Mágico”

Uma narrativa envolvente, com bom ritmo, sem violência, tecnicamente eficiente e ainda com conteúdo cultural indígena em alguns núcleos de personagens tornam Nahuel e o Livro Mágico um dos mais interessantes filmes infantis latino-americanos lançados nos últimos anos. É uma obra que tem inclusive tudo para funcionar como produto comercial (apesar das dificuldades impostas pelo mercado contra produções latinas independentes), com bastante aventura e valores humanistas saudáveis. As lendas ancestrais e paisagens chilenas são um diferencial manifestado em detalhes, associadas a elementos de cultura pop, com bruxos, monstros, animais falantes e personagens estilosos, sem riscos de estranhamento para as crianças. Em Annecy, esse equilíbrio entre uma organicidade espontânea e uma eficiência como entretenimento pode pesar a favor do filme em uma competição que tem concorrentes experimentais demais ou industriais demais.

LAVA (Longa-Metragem, Competição Contrechamp)

“Lava”

Enquanto a Terra é invadida por serpentes e gatos gigantes, a população não reage porque está hipnotizada pelas telas de tablets, TVs e telefones celulares, que transmitem um misterioso sinal. A salvação pode estar nas páginas de uma história em quadrinhos em um fanzine. Junto com um grupo de amigos, uma tatuadora tenta desvendar o enigma. Essa é a premissa da trama meio nonsense do longa-metragem argentino Lava, ficção científica apocalíptica repleta de elementos contraculturais pop e punk. As deficiências técnicas do filme são perceptíveis nos recursos de imagem e som, mas isso tudo é assumido e incorporado de forma metalinguística, com uma predominância de um estilo cartunesco propositalmente simples e econômico (às vezes demais) que por vezes lembra o seriado South Park. O conjunto é irregular, mas funciona no contexto da proposta fanzineira.

MIGRANTE (Curta-Metragem, Competição Perspectives)

“Migrante”

Formado por vários microcurtas elaborados por 50 animadores de 11 países da América Latina, o filme usa diferentes técnicas e estilos de animação para transmitir as motivações, inquietações, angústias e opressões de imigrantes. A partir dos sons de depoimentos reais, Migrante é mais um curta que adota a crescente tendência do documentário animado, com um resultado que possui verdade artística em vários momentos, apesar de poder ser confundido com uma campanha a serviço de alguma ONG humanitária.

CUCARACHA (Curta-Metrgem, Competição de Estudantes)

“Cucaracha”

Predominantemente produzido em stop motion, com desenhos 2D em alguns detalhes (nas imagens da TV do protagonista), o curta conta uma história kafkiana com elementos de humor e terror existencial. Com referências de expressionismo alemão, Cucaracha retrata a as mudanças na rotina de um operário que começa a ter alucinações com uma barata gigante por causa de uma enlouquecedora rotina de trabalho.

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