Os 1970s que Amamos (#25)
Zardoz (1974)
Por André Pinto | 30.04.2021 (sexta-feira)
No início da década de 1970, Sean Connery larga a rentável franquia de 007 e busca novos desafios dramáticos. Estigmatizado pelo personagem célebre de James Bond, não consegue nenhum papel de destaque. O ator escocês se viu forçado a aposentar da carreira de astro antes do tempo. Aceitou fazer o papel de um assassino futurista na nova produção de John Boorman, e teve sorte, pois mesmo com a produção de orçamento apertado, abocanhou um cachê atraente, custando 1/5 do valor total do filme. Mesmo assim, Connery teve que cortar despesas pessoais: usava o próprio carro para ir ao set, e ficou hospedado na casa de Boorman enquanto duraram as filmagens.
O filme foi um fracasso de bilheteria. O público torceu o nariz para a trama psicodélico-existencial de Boorman, enquanto o estúdio esperava um retorno tão popular quanto Amargo pesadelo.
O ano é 2293. A humanidade se encontra em decadência, à beira da extinção. A elite endinheirada se isola do resto do mundo e se concentra numa ” área privilegiada” da Terra, através de um campo de força invisível. Lá desenvolvem métodos avançados de controle da mente e se tornam ” eternos”, alcançando status de ” deuses”. A elite domina as periferias através da veneração: os pobres são dizimados por caçadores assassinos que obedecem à entidade ZARDOZ, representado por um imensa cabeça gigante voadora, que parece observar a todos no céu.
A trama começa quando Zed, um dos caçadores, consegue atravessar a fronteira entre a elite e a plebe, se tornando cobaia dos Eternos, que consideram o intruso uma nova ” raça” poderosa. Zed na verdade pretende romper a proteção da elite para que os caçadores destruam toda a comunidade, o que um dos eternos define como ” o momento em que a criatura irá matar seu criador”.
Confesso que minha primeira experiência ao assistir ZARDOZ, exibido na extinta tevê Manchete no fim de 1980, foi frustrante. Nessa época o filme já ganhava status de cult, mas achava por vezes insuportável acompanhar a história que construía algo a partir de um momento, para se descontruir logo mais à frente. Hoje, revisitando o espetáculo exótico de Boorman, toda as minhas impressões foram diferentes: É um filme de uma imagética impressionante. Como é bom ver o filme em alta resolução, num Panavision que deixa todo o seu visual ainda mais hipnótico (lembrando que minha primeira experiência foi numa tevê de tubo de 20 polegadas, tela abaulada e no formato cortado 4:3).
A trama, frequentemente taxada de pseudointelectual, agora faz todo sentido, principalmente por ser, antes de tudo, uma experiência sensorial. É um jogo de espelhos, uma alegoria contemporânea da raça humana, um filme fortemente político. Nosso mundo hoje se divide em Brutais, Eternos, Apáticos, Renegados e Exterminadores. E Zardoz mostra que talvez essa divisão continue imutável até que se faça um reboot e tudo comece do zero outra vez.
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