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Os 1970s que Amamos (#26)

Sem Lei e Sem Esperança (The Great Northfield Minnesota Raid, 1972)

Por André Pinto | 01.05.2021 (sábado)

Não espere um faroeste tradicional vindo de Philip Kaufman. A obra consegue ser até menos convencional do que várias outras produções do gênero lançados no mesmo período.

EUA, 1873. O país sai da guerra civil mas atravessa a primeira grande depressão americana (o Pânico de 73). É o período do boom de construção das ferrovias, cuja especulação em torno de sua expansão foi um dos estopins para o agravamento da crise. Enquanto o povo passava fome, foras da lei como Jesse James (Robert Duvall) e Cole Younger (Cliff Robertson) eram vistos como heróis, no melhor estilo Robin Hood. Quando Younger recebe a notícia que o governo está prestes a votar a favor de uma anistia para os crimes da gangue, resolve se aposentar. Jesse James discorda, e pretende assaltar um banco na cidade de Northfield, Minnesota. No fim, os dois parceiros se reencontram na cidade do título, mas o assalto trará surpresas desagradáveis.

Sem lei e sem esperança é das criaturas mais estranhas criadas pela Nova Hollywood. A história avança de forma linear, mas se prende a situações que acabam por fragmentar a ação principal. E isso não é um demérito. O resultado é fascinante. Vemos um Jesse James perverso e psicótico na pele de Robert Duvall. Uma cena marcante é quando ele convence o resto do bando a realizar o assalto, pregando palavras como se fosse um pastor fanático. Vemos o Younger de Cliff Robertson como um membro “racional”, mas esperto o suficiente para assumir o papel de líder. O personagem fica maravilhado com o avanço das novas tecnologias. Os personagens são testemunhas atônitas dos trens que “saem dos trilhos e ganham as ruas da cidade”, as máquinas que prenunciam a chegada dos automóveis. O filme tem seus momentos psicodélicos, sendo ora delírios dos personagens, ora se utilizando de situações bizarras, como o triunfo de Younger diante da população de Northfield, que mesmo acuado e preso, ainda é considerado um herói quase sobrenatural.

Cena de “Sem Lei e Sem Esperança”

Uma das cenas mais célebres da obra é o assalto em si, realizado da forma mais caótica possível. Ações equivocadas tanto de bandidos quanto de cidadãos da cidade geram violência e pânico, pontuados por uma insuportável trilha sonora (o corpo de uma das vítimas cai sobre um instrumento musical que passa a tocar continuamente – fazendo inclusive com que o espectador torça mais para que tirem o cadáver de cima da máquina do que o assalto termine)

Seguindo a mesma narrativa “fora do usual” de Pequeno grande homem, Sem Lei… é mais um exemplar notável da desconstrução de um gênero caro de Hollywood. Não é a toa que os faroestes tiveram um breve período de ostracismo na década seguinte. Seria difícil retomar temas clássicos depois de derrubar toda uma máscara heroica que se mantinha imaculada nos tempos de John Ford e Howard Hawks.

Não é todo dia que vemos uma longa cena de diálogo entre dois personagens cagando dentro de uma casinha, escolhendo papéis de jornal para se limpar, e fazendo esforços físicos para “terminar o serviço”. Seria inimaginável estabelecer a mesma cena com John Wayne e Randolph Scott, 20 anos antes.

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