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Críticas

Licorice Pizza

A juventude, essa aventura eterna.

Por Luiz Joaquim | 13.02.2022 (domingo)

O primeiro áudio que se escuta e a primeira legenda que se lê, ainda sobre uma tela preta, em Licorice Pizza (idem, EUA, 2021), anuncia indignado: “Ei, você tossiu!”.

O incauto que entrar na sala de cinema sem saber absolutamente nada sobre o novo filme de Paul Thomas Anderson (PTA), em cartaz nos cinemas a partir desta quinta-feira (17), poderá pensar: “Hmm, um filme sobre os dias de hoje”.

Daí, com as primeiras imagens na tela, o incauto entenderá que está diante de um filme de época, ocorrendo ali no início dos anos 1970, mas, ainda assim, estará certo quanto ao “filme sobre os dias de hoje”.

É assim porque Licorice… conta “uma história de amor juvenil tendo a perspectiva de uma jovem mulher no protagonismo” e é, ao mesmo tempo, uma história de qualquer época porque é “uma história de amor juvenil”: essa eterna e atemporal aventura.

Mas não é apenas o tema que faz do filme algo atemporal e, no caso de Licorice… as boas qualidades transbordam favorecendo-o para torná-lo inesquecível.

Em 2022, coisinhas redondinhas são difíceis de encontrar no cinema. Arestas sobram aos montes em enredos que tropeçam em si próprio para se desdobrarem como roteiros esforçados em impressionar o espectador, a pulso.

Licorice… oferta exatamente o oposto disso. Para começar, seu roteiro (também assinado por PTA) está muito interessado em seus personagens e não apenas nos protagonistas.

Pôster que é um verdadeiro retrato do filme

Ainda que ele (o roteiro) os apresentem (os protagonistas) com uma riqueza de detalhes que nos aproxima do casal Alana (Alana Haim) e Gary (Cooper Hoffman) pelas suas fragilidades, dúvidas e determinações, PTA nos oferece um leque largamente aberto para uma dúzia de deliciosos coadjuvantes vividos por um elenco de luxo (Sean Penn, Tom Waits, Bradley Cooper, Maya Rudolph) além de outros artistas menos badalados, mas que merecem destaque, como Sasha Spielberg (filha do Steven) e George DiCaprio (pai do Leonardo), aqui como um exótico vendedor de colchão d`agua.

Ainda sobre o roteiro: PTA sabe construir e enxertar personagens como poucos de sua geração nos EUA – isto está posto ao longo de todos os seus nove filmes –, mas vale destacar que por eles (seus roteiros), o cineasta emprega aquela estratégia própria de quem acredita na inteligência de seus espectadores, colocando a informação antes da explicação.

Tal estratégia é uma excelente (quando bem conduzida, claro) maneira de antecipar sutilezas de seus personagens e, ao mesmo tempo, dar uma sacolejada no espectador quanto a sua capacidade de percepção do que se passa a sua frente.

Em Licorice…, um exemplo concreto: o cineasta vivido por Penn dá uma cantada em Alana citando a fala de um dos seus sucessos no cinema. Rindo, Alana não entende nada, e nós, espectadores, nem desconfiamos do que está por vir após aquela cantada.

Alana de garupa: em busca de um destino feliz

É um aparente barco sem rumo este Licorice Pizza, e isso é algo raro de ser creditado como mérito num filme. Isso porque, agarrado no plot da paixão desse adolescente rechonchudinho que é Gary, 15 anos de idade, por Alana, 25, o filme nos leva a caminhos improváveis, cuja trajetória incerta segue os passos do empreendedor adolescente Gary, ou os passos do desejo de Alana em ser alguém e também ter um namorado (é 1973).

Fora dos padrões e extremamente talentosos.

Entretanto, mais uma marca de seu tempo (2021) está na aposta por atores não-convencionais no que corresponde à beleza tradicional de Hollywood. É como se PTA fizesse um gesto feio para os rostinhos perfeitamente simétricos da indústria, quando traz Hoffman (que é filho de Philp Seymour Hoffman e está estreando no cinema) para protagonista como o jovem galanteador Gary Valentine (olhem esse sobrenome).

Alana Haim também não é dona de uma beleza tradicional, nem de impecável simetria dentária, como gosta Hollywood, mas ao contrário do parceiro de cena, ela é bastante conhecida e popular na mídia norte-americana. Com a irmã Danielle cantando, Alana (e a outra irmã, Este) elas formam a banda indie-rock HAIM. O sucesso que fazem por lá não é pequeno.

A propósito, PTA é o diretor de diversos clipes da HAIM e, não à toa, Danielle e Este estão em Licorice… como irmãs da personagem Alana. Não apenas isso, pai e mãe Haim completam o time da família no elenco.

Outra curiosidade que também marca Licorice… como um filme de seu tempo e, ao mesmo tempo, atemporal está já na abertura, quando Alana caminha sensualmente pelo pátio do colégio de 2º Grau onde trabalha oferecendo ajuda aos adolescentes (entre eles, Gary) que se preparam para fazer a foto que vai para o anuário da escola.

É que a ‘caminhada’ das Haim virou uma marca nos videoclipes de PTA, e nada mais esperto do que dar as boas vindas no cinema aos milhões de fãs das irmãs artistas do que criar uma introdução como esta, servindo também ao enredo, com Gary sendo fulminado pela graciosidade dessa mulher 10 anos mais velha do que ele. “Aquela com quem vou me casar”, conforme conta ao irmãozinho de 8 anos.

Curiosidade: Em 2013, Coorper Hoffman estava na plateia da cerimônia do Oscar acompanhando o pai, que concorria a estatueta como melhor ator coadjuvante por O mestre, também dirigido por PTA. Em 2022, 9 anos depois, Cooper estará lá no Oscar acompanhando as possibilidades de Licorice Pizza como melhor filme, melhor direção e melhor roteiro. O pai estaria orgulhoso.

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