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Festivais

Roterdã, IFFR (2022) – Kafka for Kids

Filmes israelense de Roee Rosen na Tiger Competition

Por Marcelo Ikeda | 11.02.2022 (sexta-feira)

Os festivais de cinema costumam ser palco de obras ousadas e arriscadas. Mas até que ponto a ousadia se torna mero produto publicitário para despertar a atenção para si, sendo que, para além do espalhafato, perguntamo-nos o que aquele projeto de fato instaura de crise ou reflexão sobre as estruturas institucionalizadas no cinema (como instituição e como linguagem) ou mesmo no mundo?

É o que fico pensando ao final de um filme como Kafka for kids, do israelense Roee Rosen. Mas é certo que se trata de um dos filmes mais bizarros dessa edição do Festival de Rotterdam.

Trata-se de uma piada conhecida que A metamorfose, de Franz Kafka é infilmável. E que Kafka passou a ser quase um popstar, devido à forma como a publicidade do mercado de arte explora o mito romântico do gênio introvertido, pouco valorizado em vida, e que explodiu após seu suicídio, assim como Van Gogh. Ou seja, artistas com uma linguagem extremamente radical foram absorvidos pelo mercado de arte – um dos paradoxos de como a arte se transformou como mercadoria, e de como isso domestica o impacto subversivo desses artistas, profundamente contestadores.

Pois se Kafka virou um ídolo pop (no Brasil, lembro logo da impagável música dos Inimigos do Rei) e se sua novela curta parece ser infilmável, esses parecem ser um bom motivo para que filmes sejam realizados.

Assim, Kafka for kids parte dessa premissa para instalar sua bizarrice. O filme é uma mistura de uma animação surrealista sombria à la Jan Svankmajer com uma paródia de um programa de televisão multicolorido para crianças.

As cenas em cinema de animação são parte do programa de televisão, que surge por meio de dois cenários integrados em um, por meio de um estúdio bastante estilizado com grande papel da cenotécnica, objetos e cores vivas, composta basicamente por dois elementos: uma bancada de apresentação com um professor-leitor e uma jovem aluna, acompanhados de objetos falantes e, o segundo, com uma banda musical ao lado. Momentos de comédia musical se infiltram em blocos entrecortados por vinhetas como se anunciassem os intervalos do programa. Enquanto o professor lê o conto para uma jovem, as situações bizarras se multiplicam.

Após o choque e o susto iniciais, com o tempo o filme perde seu fôlego e se torna cansativo e repetitivo. De todo modo, ainda que o filme a apresente fora das convenções visuais do classicismo, a obra de Kafka não gera um mal estar ou um questionamento das estruturas de reconhecimento sociais mas um mero carrossel de bizarrices alimentada pela indústria cosmética. Por isso, ao final, para além do inicial choque visual, esse pastiche de um programa de televisão, se pode ser visto como uma crítica à banalização desses recursos, incorpora essa mesma banalização em sua própria estrutura, contribuindo pouco para uma mais profunda reflexão crítica sobre o autor tcheco e o legado de sua escritura visionária.

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