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Festivais

50º Gramado (2022) – “Tinnitus” e “Imersão”

A complexidade do humano pela excelência estética.

Por Luiz Joaquim | 20.08.2022 (sábado)

– na foto de Cleiton Thieli/Agência Pressphoto, Antônio Pitanga (e) com Gregório Graziosi apresentam Tinnitus.

GRAMADO (RS) – A última noite da mostra competitiva aqui no 50º Festival de Cinema de Gramado – na quinta-feira (18) – trouxe o longa-metragem Tinnitus, de Gregório Graziosi. Tendo assinado o anterior Obra, com Irandhir Santos, Graziosi reafirma no novo trabalho o seu interesse pela forma e a aposta na estética como o dispositivo que irá disparar as emoções em seu espectador.

Importante situar o leitor, como Graziosi fez ao apresentar o filme no Palácio dos Festivais, a respeito do título. Tinnitus é uma doença auditiva, menos rara do que se imagina, pela qual a pessoa passa a escutar ruídos constantes, como, por exemplo, de um grilo “dentro de sua cabeça” e, com a constância desse incômodo, a vítima pode desenvolver uma série de outras complicações, inclusive psicológicas.

Sendo progressivo e ainda indefinido em suas origens, a vítima do tinnitus pode receber um tratamento que é apenas paliativo.

A partir de tal enfermidade, Graziosi constrói sua protagonista Mariana (Joana de Verona), uma atleta de saltos ornamentais que precisa interromper uma carreira em ascenção em direção aos jogos olímpicos ao lado da parceira de competições (Indira Nascimento, de Medida provisória).

Obrigada a deixar as plataformas de saltos, Marina vai trabalhar fantasiada de sereia fazendo apresentações num aquário, enquanto a colega atleta começa a treinar com sua substituta, Tereza (a franco-americana Alli Willow, de Bacurau) para participar das Olimpíadas no Japão.

Na entrevista coletiva de ontem (19) pela manhã, a primeira pergunta veio indagar Graziosi sobre o formalismo em sua produção e as possíveis limitações de envolvimento com o enredo diante de um espectador mediano. Joana de Verona aproveitou para comentar sobre a pertinência desse chamado formalismo em Tinnitus ao levar em conta que a prática de atletas, como a da sua personagem, é buscar a perfeição simétrica em seus resultados, e o quanto era interessante o filme acompanhar esse conceito.

Joana de Verona em cena de “Tinnitus”

Maria do Rosário Caetano, que lançou a pergunta, está correta em dizer que, no caso de Tinnitus, ainda que haja um atraente conflito humano de disputa entre Marina, após descobrir sua doença, contra a sua ex-parceira – com espaço também para uma tensão sexual entre Marina e a sua substituta Tereza –, Tinnitus parece sobressair, ou deixar sua mais forte impressão, nas composições entre imagem e som buriladas na fotografia de Rui Poças com o desenho de som de Fábio Baldo que, inclusive, deve ter se divertido ao trabalhar nas inventivas distorções sonoras que perturbam Marina.

Ainda no elenco, Antônio Pitanga em luxuosa participação afetiva como um idoso em estado mais avançado da tinnitus, que se torna amigo de Marina.

Graziosi, cinéfilo que é, relaciona o personagem de Pitanga (e dicas estéticas do filme) ao paulista bairro da Liberdade, tradicional pela histórica ocupação japonesa, propondo uma ligação entre o antigo atleta com a sua juventude, competindo nas Olimpíadas do Japão de 1964.

Vale o registro que Tinnitus tem participação fundamental em sua composição de profissionais do cinema de Pernambucano, principalmente nas figuras de Leo Lacca, na pesquisa de elenco, e de Eduardo Serrano com editor.

IMERSÃO – O último longa-metragem latino a competir veio do Chile, pelas mãos de Nicolás Postiglioni. Com experiência na publicidade, Postiglioni imprimiu em seu Imersão a dinâmica própria dos bons thrillers, pelas quais uma tensão crescente vai sugando o espectador até fazê-lo sentir o incômodo dos personagens, com todos envolvidos numa teia confusa e urgente de ser desembaraçada, mas sem uma porta de saída aparente.

Equipe do filme “Imersão” no Palácio dos Festivais | Foto: Cleiton Thiele/Agência Pressphoto

No caso, acompanhamos Ricardo (o ótimo Alfredo Castro, de Tony Manero) em seu barco com as duas filhas velejando num imenso lago em direção ao casarão de veraneio da família. Seu desejo é vender a casa a beira do lago, que está caindo aos pedaços, por conta do desinteresse de todos.

No caminho, avista três homens num pequeno bote afundando. Ao invés de socorrê-los, acelera na direção contrária, o que causa indignação em sua filha mais nova (Consuelo Carreño). Uma vez decidido a ajudar os homens a quem julga serem bandidos, Ricardo se vê na condição de começar uma busca por um deles, que pulou n`água por razões não esclarecidas,  o que só aumenta a suspeita preconceituosa do protagonista.

Still de “Inmersión”

Distante da maioria dos títulos latinos exibidos em Gramado, com sua intenção muito particular em ativar os nervos da plateia pela atmosfera do gênero, Imersão é competente em todos os aspectos a que se propõem. E, muito embora, difira nesse quesito dos concorrentes (estes mais interessados em arriscar esteticamente), a produção chilena é um bom candidato ao Kikito de melhor filme.

DOCUMENTARIO – Na noite de ontem (19), foi promovida a projeção no Palácio dos Festivais do primeiro documentário premiado no Festival de Gramado. A ação encerrava uma sequência de exibições de documentários, no decorrer dessa semana, pelo Canal Brasil, cujo voto popular definiria seu vencedor.

O paulista Um par para chamar de meu, de Kelly Cristina Spinelli, levou o prêmio contando a história de cinco mulheres da terceira idade, uma delas a sua própria mãe, com as suas rotinas noturnas de frequentarem bailes dançantes com seus personal dancers. Eles são profissionais pagos para acompanhá-las na pista e que acabam por tornarem-se mais do que simples parceiros da diversão.

Kelly Cristina Spinelli apresente o seu “Um Par para Chamar de Meu” | Foto: Cleiton Thiele/Agência Pressphoto

Solidão, sexualidade, realização (ou não) no casamento são alguns dos temas que perpassam pelos depoimentos das personagens que, entre si, alternam maior ou menor impacto na tela conforme sua personalidade. É um filme inspirador, mas de impacto limitado como cinema. Daí todo o sentido em sua vitória pelo júri popular que o elegeu assistindo-o pela tevê ou pela plataforma de streaming da Globo.

Toda a cerimônia de premiação do 50º Festival de Gramado acontecerá hoje (20), com transmissão pelo Canal Brasil a partir das 21h.

– Viagem a convite do Festival

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