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Críticas

Bem-vindo a Quixeramobim

Halder Gomes nos joga no colo mais uma presepada como só ele consegue conceber

Por Luiz Joaquim | 13.10.2022 (quinta-feira)

O quinto filme com direção solo do cearense Halder Gomes, Bem-vindo a Quixeramobim (Bra., 2022), chega hoje aos cinemas de Pernambuco e aos da terra natal do cineasta. Por lá, à propósito, Halder é um fenômeno absoluto. A lista do contexto que comprova a assertiva é extensa. Seu Cine Holliúdy (2013) fez história por lá, ou melhor, no Brasil quase que por completo, e o seu mais recente Cine Holliúdy 2: A chibata sideral (2019) conquistou mais de 50 mil espectadores em uma semana exibindo apenas no NE e em Brasília. Por ocasião do lançamento no Ceará, o filme bateu a bilheteria de ninguém menos que Capitã Marvel.

A competência de Halder passou a ser algo tão escandaloso que o realizador foi parar na maior emissora de televisão do País. Seu Holliúdy passou a integrar a programação noturna da TV Globo a partir de 2019 e até aqueles que falam mal (por ignorância) do cinema brasileiro passaram a gargalhar alto na poltrona de casa com as presepadas do sonhador Francisgleydisson, cria de Halder encarnado pelo sempre ótimo Edmilson Filho.

Halder chega agora com um novo herói, ou melhor heroína, numa comunhão, já de partida, inteligente com quem tem o protagonismo – a mulher – no cinema mundial recente. Ela é Aimée (Monique Alfradique, estreando no cinema), influencer com 50 mil seguidores que tem todos os bens da família bloqueados quando o pai trambiqueiro é preso pela polícia federal. Da herança, resta uma casa no interior do Ceará.

Darlan (Edmilson Silva), um inicial antagonista da heroína Aimée

Com o plano de vender o imóvel em Quixeramobim (a 214 quilômetros de Fortaleza), ela inventa para seus seguidores que está dando uma volta o mundo, numa espécie de ano sabático. Ao chegar no pequeno município, descobre que Darlan (Edmilson Silva) não apenas reside em sua propriedade como alega ter comprado o imóvel.

Fica, assim, armado um dos motes que compõem os quatro núcleos de comicidade em Quixeramobim. O primeiro deles, e melhor, está centrado na adaptação de Aimée na chegada ao Ceará. Quando em Fortaleza aluga o carro Chevrolet Classic caindo aos pedaços; passando pelo posto de gasolina em desespero por um banheiro; depois a bordo de um ‘pau-de-arara’ até a sua chegada na pensão de Genésia (Valéria Vitoriano). Casa que, à noite, vira um cabaré.

Ajudando na pensão/cabaré, vivem Shirleyanny (a pernambucana Chandelly Braz, também estreando no cinema) e Eri (o youtuber e ator cearense, Max Petterson, mais um chegando à telona pela primeira vez pelas mãos de Halder). Eri é um dos seguidores, nas redes sociais de Aimée, que vira seu escudeiro na luta da protagonista para resgatar o seu imóvel.

Aimée (Alfradique) em sua aventura num pau-de-arara

Os outros dois núcleos cômicos se dividem num romance inesperado vivido por Aimée e na luta que a moça assume para salvar a pequena cidade contra o desvio ilegal de um rio que abastecia a população local.

Acontece que o volume de tantas situações complexas concentradas nos 106 minutos do filme parece não se comunicar na segundo metade do filme com a mesma fluidez que se resolve na primeira metade.

Desde a apresentação de Aimée ao espectador, passando pelo seu primeiro contato com os cearenses e chegando ao seu estranhamento com a pousada/cabaré é como se o filme acionasse um ato contínuo de sorriso no espectador. A graça segue forte, de uma sequência a outra, ‘sem escala’.

O mesmo não acontece a partir do romance inesperado nem na luta dos moradores, liderados por Aimée, para reconquistarem o que já era deles. São tropeços difíceis de destrinchar sobre sua origem: se pelo roteiro coletivo de Halder com L. G. Bayão e Marina Morais, ou se pela edição pragmática de Helgi Thor.

Uma coisa é certa: a direção de Halder é generosa com a edição. São tantos os planos para uma mesma situação que só reforçam a dinâmica cômica dos diálogos rápidos e com tantos personagens satélites em cena – uma marca muito bem calibrada na direção de Halder.

O mesmo pode ser dito dos atores. Todos estão aparentemente à vontade vestindo seus personagens, ainda que sob um perceptível controle do diretor, para dar o tom equilibrado do todo.

Não é uma missão simples, a que Halder se compromete na composição de suas histórias, uma vez que o cineasta usa e abusa, no melhor do termo, dos personagens satélites compondo um cenário humano que funciona como ótima ‘escada’ a seus protagonistas e, ainda, dando a cada um destes ‘satélites seus momentos de humor próprio.

Só aqui temos o dono do bar da cidade, Aurenizo (Falcão), Dona Clemilda (Roberta Wermont) e seu filhinho catarrento (João Guilherme), Do Contra (Carri Costa), Meióta (Paulo Sérgio Bolachinha), a crente Amélia (Araci Breckenfeld), Heron (Silvero Pereira) e muitos outros.

NOVOS PROJETOS – Tão impressionante quanto o estilo único estabelecido por Halder no contemporâneo cinema brasileiro, só mesmo a sua prolífera capacidade criativa.

Até o final deste 2022, deve chegar nas tevês brasileiras sua nova série, O cangaceiro do futuro, com Edmilson Silva fazendo nova presepadas na pele de Virguley, um sósia de Lampião que faz apresentações em São Paulo enquanto nutre o desejo de voltar para Nordeste. Mas pela brincadeira do cinema, Virguley vai parar no ano de 1927 e é confundido com o verdadeiro Lampião. Também no elenco, Chandelly Braz como par romântico de Edmilson.

E, mais adiante, com distribuição da Pandora Filmes, Halder deve colocar um outro projeto audacioso nas telas do cinema. Audacioso por conta do tom proposto: menos o do humor e mais o da reflexão. Fã das artes plásticas, e ele próprio um diletante do assunto, Halder roteirizou e dirigiu Vermelho Monet em co-produção com Portugal.

No filme, rodado em 2019 em Lisboa, o enredo acompanha o pintor Johannes Van Almeida (Chico Diaz), que deixa a prisão após acusações de falsificações e segue para a Europa onde tenta iniciar uma nova vida. Seu caminho toma um novo rumo quando a marchand de arte Antoinette (Maria Fernanda Cândido) e a atriz internacional em crise, Florence Lizz (Samantha Heck Muller), entram em cena.

Vermelho Monet é um projeto que Halder acalanta e o desenvolve desde 2012. Que venha essa nova luz desse mais que talentoso cearense.

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