55º Brasília (2022) – Balanço, Premiados
Um festival enxuto e firme em seu conteúdo fortemente reflexivo e político
Por Paulo Henrique Silva | 21.11.2022 (segunda-feira)
– na foto divulgação acima, o cineasta Bruno Jorge recebe o Candango de melhor filme: A Invenção do Outro
A semana da 55ª edição do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro começou no dia 14, com um Big Bang, curta-metragem dirigido por Carlos Segundo, mas a “explosão” só se deu mesmo na noite de sábado, com a exibição do documentário A Invenção do outro, de Bruno Jorge, trabalho que bombardeou a plateia do Cine Brasília com imagens fortes e emocionantes.
Apesar do desafio de organizar um festival em pouco tempo e orçamento limitado, Brasília voltou ao formato presencial, não deixando de lado o seu conteúdo fortemente reflexivo e político. A poucos quilômetros do Palácio do Planalto, o Cine Brasília, sede do festival, fez um balanço dos últimos quatros anos de governo e trouxe uma injeção de esperança.
A catarse provocada por A invenção do outro, assinado pelo mesmo diretor de Piripkura, foi consagrada na premiação, realizada na noite deste domingo. Os espectadores ainda mediam os impactos de um filme que, apesar de não ser o seu tema, ganhou forma denúncia, por ser conduzido pelo indigenista Bruno Pereira, assassinado em junho por garimpeiros ilegais.
Havia o temor de que não houvesse tempo para que esse tremor gerado pelo filme não alcançasse o júri. Mas não foi o que aconteceu. O documentário levou o grande prêmio, além dos Candangos de melhor fotografia, montagem e edição de som. Para um filme de não-ficção, sem atores, a sensação é de os jurados enxergaram uma obra singular, muito acima dos demais concorrentes.
Com um trabalho documental fantástico, restrito pela falta de recursos de quem entra numa floresta virgem e recheada de perigos, o resultado impressiona, nos trazendo aquilo que seu título promete: estar no lugar do outro. No caso, indígenas que não tido qualquer contato com os brancos e que nos dão um belíssimo ensinamento sobre valores.
Alguns degraus abaixo, Mato seco sem chamas também é um filme forte, que trafega por outro caminho desguarnecido pelo governo atual: o pobre. Mais: o pobre preto. Mais ainda: pobre, preto e mulher. O longa de Joana Pimenta e Adirley Queirós envereda por gêneros como ficção científica e faroeste, moldados de forma irônica e emblemática à realidade social brasileira.
Mato Seco… levou sete Candangos: direção, roteiro, direção de Arte, trilha sonora, atriz (dividido entre as protagonistas Lea Alves e Joana D’Arc), atriz coadjuvante para Andreia Vieira, e ator coadjuvante para o coro de motoqueiros destacados no filme. Um prêmio curioso, meio debochado, assim como o troféu de melhor ator para Carlos Francisco, de Canção ao longe, de Clarissa Campolina.
O trabalho de Francisco é consistente, mas seria mais adequado à categoria de ator coadjuvante. Esse detalhe estampa outra característica desse festival: as mulheres foram as grandes protagonistas – da apresentação no palco, com Bárbara Colen e Dandara Pagu (no último dia) à equipe de produção capitaneada por Sara Rocha, uma coordenadora que, no lugar dos desvarios de quem ocupa essa função, mostrou muita serenidade e seriedade.
O Festival foi enxuto, mas preciso. Se deixou a desejar em algo: os constantes atrasos na programação. A cerimônia de encerramento terminou de madrugada, à 1h30, já esvaziada e sem poder fazer a tradicional foto dos ganhadores no palco. A seleção, especialmente nos curtas, foi irregular, mas era perceptível a intenção dos curadores em buscar uma unidade temática em torno de outros protagonistas.
Na categoria curta-metragem, a maior parte dos vencedores apontou para obras que retratam questões raciais e pessoas à margem da sociedade. Escasso, melhor filme do júri oficial, e Calango maior, escolhido pela comissão de críticos da Abraccine, oferecem muitas camadas sobre a realidade da mulher negra, em tom de ironia, e a ressignificação dos corpos negros, respectivamente.
Confira a lista completa de vencedores da 55ª edição do Festival de Brasília
Mostra Competitiva Nacional
Longas-metragens
A Invenção do Outro de Bruno Jorge
Melhor Longa-metragem pelo Júri Oficial
Rumo de Bruno Victor e Marcus Azevedo
Melhor Longa-metragem pelo Júri Popular
Adirley Queirós e Joana Pimenta por Mato Seco em Chamas
Melhor Direção
Lea Alves e Joana Darc em Mato Seco em Chamas
Melhor Atriz
Andreia Vieira em Mato Seco em Chamas
Melhor Atriz Coadjuvante
Carlos Francisco em Canção ao Longe de Clarissa Campolina
Melhor Ator
Para o coro de motoqueiros de Mato Seco em Chamas
Melhor Ator Coadjuvante
Adirley Queirós e Joana Pimenta por Mato Seco em Chamas
Melhor Roteiro
Bruno Jorge por A Invenção do Outro
Melhor Fotografia
Denise Vieira por Mato Seco em Chamas
Melhor Direção de Arte
Muleka 100 Kalcinha por Mato Seco em Chamas
Melhor Trilha Sonora
Bruno Palazzo e Bruno Jorge por A Invenção do Outro
Melhor Edição de Som
Bruno Jorge por A Invenção do Outro
Melhor Montagem
Rumo de Bruno Victor e Marcus Azevedo
Prêmio Especial do Júri
Mostra Competitiva Nacional
Curtas-metragens
Escasso, da Encruza (Clara Anastácia e Gabriela Gaia Meirelles)
Melhor Curta-Metragem pelo Júri Oficial
Calunga Maior de Thiago Costa
Melhor Curta-metragem pelo Júri Popular
Clara Anastácia e Gabriela Gaia Meirelles por Escasso
Melhor Direção
Clara Anastácia em Escasso de Clara Anastácia e Gabriela Gaia Meirelles
Melhor Atriz
Giovanni Venturini em Big Bang de Carlos Segundo
Melhor Ator
Rogério Borges por Lugar de Ladson de Rogério Borges
Melhor Roteiro
Yuji Kodato por Lugar de Ladson de Rogério Borges
Melhor Fotografia
Joana Claude por Capuchinhos de Victor Laet
Melhor Direção de Arte
Podeserdesligado em Calunga Maior de Thiago Costa
Melhor Trilha Sonora
Som de Black Maria (Isadora Maria Torres e Léo Bortolin) por Lugar de Ladson de Rogério Borges
Melhor Edição de Som
Edson Lemos Akatoy por Calunga Maior de Thiago Costa e Nem o mar tem tanta água de Mayara Valentim
Melhor Montagem
Ave Maria de Pê Moreira
Melhor filme de Temática Afirmativa
Mostra Brasília – Prêmios do Júri Oficial
24º Troféu Câmara Legislativa
O Pastor e o Guerrilheiro de José Eduardo Belmonte
Melhor longa-metragem (prêmio de R$100.000,00)
Levante pela Terra de Marcelo Costa (Cuhexê Krahô)
Melhor curta-metragem (prêmio de R$30.000,00)
Thiago Foresti, por Manual da Pós-verdade
Melhor direção (prêmio de R$12.000,00)
Wellington Abreu, por Manual da Pós-verdade
Melhor ator (prêmio de R$6.000,00)
Issamar Meguerditchian, por Desamor
Melhor atriz (prêmio de R$6.000,00)
Juliana Corso, por Virada de Jogo
Melhor roteiro (prêmio de R$6.000,00)
Elder Miranda Jr. por Manual da Pós-verdade
Melhor fotografia (prêmio de R$6.000,00)
Augusto Borges, Nathalya Brum e Douglas Queiroz, por Plutão não é tão longe daqui
Melhor montagem (prêmio de R$6.000,00)
Nadine Diel, por Manual da Pós-verdade
Melhor direção de arte (prêmio de R$6.000,00)
Olivia Hernández, por O Pastor e o Guerrilheiro
Melhor edição de som (prêmio de R$6.000,00)
Sascha Kratzer, por Capitão Astúcia
Melhor trilha sonora (prêmio de R$6.000,00)
Mostra Brasília – Prêmios do Júri Popular
24º Troféu Câmara Legislativa
Capitão Astúcia, do diretor Filipe Gontijo
Melhor longa-metragem (prêmio de R$ 40.000,00)
Desamor, do diretor Herlon Kremer
Melhor curta-metragem (prêmio de R$ 10.000,00)
Mostra Brasília – Menções Honrosas do Júri Oficial
À Ivan Presença e Chiquinho da UnB, personagens do longa Profissão Livreiro, de Pedro Lacerda
Menção honrosa do júri
Ao curta-metragem Super-heróis
Menção honrosa do júri
Prêmios Especiais
Prêmio Zózimo Bulbul
Concedido em parceria com a Apan – Associação dos Profissionais do Audiovisual Negro e o Centro Afrocarioca de Cinema, para o curta e o longa-metragem que tenha como horizonte o corpo negro na frente e por trás das câmeras, e a inovação estética e narrativa na abordagem das subjetividades negras. Em 2022, o júri do prêmio Zózimo Bulbul foi composto pela realizadora cuiabana Paula Dias, a produtora audiovisual do DF Adriana Gomes e o coordenador de projetos do Centro AfroCarioca Vitor José.
Rumo, de Bruno Victor e Marcus Azevedo
Prêmio Zózimo Bulbul de Melhor longa-metragem
Calunga Maior de Thiago Costa
Prêmio Zózimo Bulbul de Melhor curta-metragem
Prêmio Marco Antônio Guimarães
Concedido pelo Centro de Pesquisadores do Cinema Brasileiro (CPCB) ao filme que melhor utiliza material de memória, pesquisa e arquivos do cinema brasileiro.
Diálogos com Ruth de Souza de Juliana Vicente
Prêmio Marco Antônio Guimarães
Prêmio Canal Brasil de Curtas
Cessão de um Prêmio de Aquisição no valor de R$ 15 mil e o troféu Canal Brasil, ao Melhor Filme de curta-metragem selecionado pelo júri Canal Brasil.
Nossos passos seguirão os seus… de Uilton Oliveira
Prêmio Canal Brasil de Curtas
Prêmio Abraccine
Oferecido pela Associação Brasileira de Críticos de Cinema nas categorias melhor longa-metragem e melhor curta-metragem.
Mato Seco em Chamas, de Adirley Queirós e Joana Pimenta
Prêmio Abraccine de Melhor longa-metragem
Calunga Maior de Thiago Costa
Prêmio Abraccine de Melhor curta-metragem
Troféu Saruê
Conferido pela equipe de cultura do jornal Correio Braziliense ao melhor momento do festival.
À memória do indigenista Bruno Pereira, documentado em A Invenção do Outro, de Bruno Jorge
Troféu Saruê
Serviço – Exibição dos longas vencedores do 55º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro
“Capitão Astúcia”, de Filipe Gontijo
Segunda (21/11), às 18h
“O Pastor e o Guerrilheiro”, de José Eduardo Belmonte
Segunda (21/11) às 20h
“Rumo”, de Bruno Victor
Terça (22/11), às 18h
“A Invenção do Outro”, de Bruno Jorge
Terça (22/11), às 20h
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