Till: A Busca por Justiça
A coragem de uma mãe por uma luta que não é apenas a sua.
Por Luiz Joaquim | 07.02.2023 (terça-feira)
Till: A busca por justiça (Till, EUA, 2022), da nigeriana Chinonye Chukwu, entra em cartaz nesta quinta-feira (9) como um filme pertinente, valioso e, inclusive, necessário, mas, pela ótica puramente cinematográfica, é também um filme com excessos.
Pertinente porque, infelizmente, com a nossa memória ainda assombrada pelo assassinato de George Floyd, reascendemos o horror quando acompanhamos, há cerca de um mês, pelos noticiários mais um coquetel de racismo e abuso de autoridade de policiais norte-americanos resultando na morte de Tyre Nichols, aos 29 anos, em Memphis.
Till é valioso pelo que nos oferece pela performance da protagonista Danielle Deadwyler como Mamie Till-Mobley, que perde o filho, de 14 anos, Emmett Till, ou apenas Bo (Jalyn Hall), para o ódio racista no Mississippi de 1955.
Deadwyler trabalha aqui no modo possessão. O que ela faz com a dor vivida por Mamie não é explicado pela ciência.
E o filme é, em si, necessário como qualquer outra obra que se levante de forma altiva contra o racismo.
Entretanto, os excessos podem ser vistos, e principalmente ouvidos, neste que é o segundo longa-metragem para o cinema de Chukwu.
Ela nos guia pelo enredo dessa feliz família de afro-americanos com a viúva Mamie, seu filho Bo e sua mãe Alma (Whoopi Goldberg, em participação generosa) vivendo dignamente em Chicago.
De férias, por sugestão da avó Alma, e para o pavor de Mamie, Bo vai passar algumas semanas com os primos no minúsculo município de Money (Mississippi). Por um mal entendido com a dona branca de um estabelecimento local, Bo é cassado pelo marido dela e seu amigo. O resultado da caça é devastador para Mamie e ela faz da injustiça uma causa para a sua vida.
É sobre o amor dessa mãe machucada para a eternidade e a sua coragem de levar adiante um julgamento natimorto – por ser contra brancos, com um juiz e jurados brancos no Mississippi de 1955 – que Till quer tratar.
Um dos pontos centrais aqui, plasticamente falando, é o estado do maltrato sofrido por Bo quando foi sequestrado em Money. A diretora Chukwu, também roteirista com Michael Reilly e Keith Beauchamp (este também autor do doc. A história não contada de Emmett Louis Till, 2005), desenvolve bem a tensão no espectador que está diante de um velado corpo de um adolescente espancado, mas que nunca vê o horror em detalhe.
Nunca vê, vírgula: um momento preciso foi escolhido aqui para desvelar o horror que resultou da brutalidade contra o menino.
Diante do horror, o espectador mais sensível pode se perguntar se o plano em detalhe seria realmente necessário ao filme. A resposta é sim, uma vez que a decisão de Mamie em expor o filho desfigurado à impressa, há 68 anos, foi o que resultou no que vemos a seguir no enredo do filme.
Não só lá, mas também na vida real. Por conta do caso, nunca esquecido por aqueles que lutam pelos direitos civis nos EUA, foi promulgada, num tardio 2022, uma lei norte-americana que leva o nome do garoto Emmett Till, definindo linchamento um crime federal naquele país.
Os excessos em Till, porém, também estão lá e pode ser visto, por exemplo, numa gordura melodramática como aquela em que Mamie visita a loja onde tudo aconteceu a Bo, ou quando a trilha sonora do polonês Abel Korzeniowski insiste em ressaltar o sofrimento de Alma, culpando-se por ter sido ela quem sugeriu a ida do menino ao Mississippi.
Excessos assim, entre outros, refletem algum tipo de insegurança de quem conta uma boa história. E Chukwu não tinha apenas uma boa história – mais que boa: pertinente, valiosa, necessária -, ela tinha também Danielle Till-Mobley em estado de graça, dando contenção quando lhe pediram e dando perturbadora explosão na hora da dor maior de uma mãe e durante o julgamento do crime contra o seu filho.
Em tempo: Para uma sessão dupla com Till, ir atrás de Mississippi em chamas (1988), de Alan Parker, indicado a sete Oscars mas ‘oscarizado’ apenas pela fotografia de Peter Biziou.
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