Não vá atrás de quem anda dizendo que é apenas um comercial reunindo Yves Saint Laurant e Pedro Almodóvar. Estranha Forma de Vida, com seus meros 30 minutos, é um baita filme. E um filme que a cada plano, cada diálogo milimetricamente pensado, provocam um prazer imenso de assistir. Chamar de faroeste fashion é só uma piadinha boba.

O contexto desta produção é a pandemia, quando Pedro Almodóvar dirigiu dois curtas, A Voz Humana,  com Tilda Swinton,  e Estranha Forma de Vida, com  Ethan Hawke e Pedro Pascal . Um western gay com os clichês do gênero e ao mesmo tempo uma atualização do gênero. Se Marlon Brando, Clint Eastwood, Sam Peckinpah  e Ang Lee (ok, e Otto Guerra também)  sacudiram a poeira dos arquétipos do bem e do mal e da masculinidade padrão,  Almodóvar  revisita Sérgio Leone e homenageia Sam Peckinpah. E ainda consegue a estranha proeza de ser exibido em salas de cinema como um épico que recoloca a família enquanto valor civilizatório. Uma estranha família.

O recurso da entrevista que vem na sequência fechando 80 minutos de projeção, pode ser visto como apenas uma forma dos cinemas terem topado a ideia insólita. Mas de fato ouvir Almodóvar detalhando o filme, como pensou o roteiro, como filmou, como usou os cenários de Sérgio Leone na Espanha, como Alberto Iglesias se inspirou em Ennio Morricone, enfim, é uma aula de western.  De um ponto e vista inusitado, mas nem por isso menos interessante ou menos culto. Almodóvar conhece bem a filmografia do gênero e cita diretores (especialmente Peckinpah) com total pertinência.

Cena de “Estranha Forma de Vida”

A entrevista é um bônus que transforma o curta  em algo maior, não só porque fecha 80 minutos, mas porque o diretor manchengo, instado pela entrevistadora, fala o que imagina que acontece com os personagens após a cena final. Diz que não seria um longa, mas se fosse, aconteceria isto e aquilo com os personagens. Conta com tanta riqueza de detalhes que “vemos” a continuação do curta  e o que aconteceria com os outrora amantes Jake e Silva  e o filho deste.

E tudo faz muito sentido no universo almodovariano.

Portanto, quem desdenhar de Estranha Forma de Vida porque cheira a um comercial de luxo, estará perdendo um espetáculo de imagens e de imaginação.