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Perdemos Fernando Monteiro

Crítico de arte, cineasta e escritor pernambucano nos deixa com o seu imenso legado e generosidade

Por Luiz Joaquim | 13.02.2025 (quinta-feira)

O clichê que diz “ficamos mais pobres com a partida de” pode soar vazio na maioria das orações em que é empregado. Hoje ele pode ser usado com toda a sua propriedade quando sabemos que perdemos o crítico de arte, cineasta e escritor pernambucano Fernando Monteiro (1949-2025).

Fernando nos deixou ontem (12) e, dele, ficou para nós, brasileiros, não só o conhecimento mas a elegância do conhecimento. Sábio generoso existe? Só pergunta isto quem não conheceu Fernando.

A sensibilidade para arte estava lá, como parte integrante do intelectual, desde a juventude, quando foi estudar cinema na Itália.

Ali na segunda metade dos 1960, alguns jovens surgiram na crônica pernambucana de cinema e também marcaram seu espaço. Um desses foi o adolescente Fernando Monteiro (futuro cineasta e escritor), que aos 18 anos teve seu primeiro texto publicado na coluna de outro Fernando, o Spencer, no Diário de Pernambuco.

Logo depois, entre janeiro de 1971 e dezembro de 1972, produziu e apresentou na TV Universitária os programas “Cinema Ontem, Hoje e Amanhã” nas terças-feiras, e “O que o Recife vê” nas sextas-feiras, ambos às 18h30.

No primeiro, Monteiro abordava o cinema do passado, do momento presente (difícil, pela circunstância política) e as possíveis tendências do cinema brasileiro. Em certa edição, ao vivo, do primeiro ano de “Cinema Ontem…”, Monteiro teve como ponto alto a presença de Alberto Calvalcanti (1907-1982) para uma entrevista.

Monteiro (de preto) entrevista Alberto Cavalcanti para a TV no Recife, no programa “Cinema Ontem, Hoje e Amanhã”, início dos 1970

Em meados de 1972, o programa passou a ser gravado, quando incluiu trailers, cartazes e outros materiais fornecidos por distribuidoras a respeito dos títulos em exibição nos grandes cinemas do centro do Recife.

Ainda em 1972 realizou o já clássico curta-metragem Visão apocalíptica do radinho de pilha (exibido no Festival de Guadalajara, México) e, junto a este, com tantos outros filmes, amealhou diversos prêmios no Brasil e no exterior.

A saber: Filme de Percussão Mercado Adentro (1974, Festival de Karlov-Vary, RDA); Saideira (1980, Festival de Varsóvia), Brennand: Sumário da Oficina pelo Artista (Festival de Brasília, 1977), Escuriais Rústicos (1976), Bumba-meu-boi da Vida (1978)”, Oh, Segredos de uma Raça (1979), Cultura Marginal BrasileiraLeilão Sem Pena” (1981, Festival de Cinema de Aracaju), Cultura Marginal Brasileira, O Pharol, Simetria Terrível ou Mecânica de JC e A Pedra do Sono, entre outros todos em 35mm.

Foi também o idealizador e produtor do Projeto Cinematográfico de Pesquisa Sociológica, Antropológica e de Comunicação Social, recomendado pelo cineasta  Alberto Cavalcanti, de quem ficou amigo, ao então Instituto Nacional do Cinema – INC, em 1974.

Em 1976, conquistou, como poeta, o Prêmio Othon Bezerra de Mello da Academia Pernambucana de Letras, com a peça O Rei Póstumo – e o Prêmio Nacional da UBE/Rio, com Ecométrica, editado por Massao Ohno Editor (SP).

A estréia como romancista foi em Portugal, em 1997, com Aspades, ETs Etc – considerada a “melhor obra de ficção, em língua portuguesa”, daquele ano. O livro foi lançado no Brasil em 2000, pela Editora Record, que já lançara o romance A Cabeça no Fundo do Entulho – pelo qual Monteiro conquistou o Prêmio BRAVO! de Literatura, em 1999.

No ano de 2001, pela editora Globo, lançou A Múmia do Rosto Dourado do Rio de Janeiro e depois, pela mesma editora, o romance O grau Graumann, em 2002.

No ao seguinte, pela Editora W11, lançou o livro de contos “Armada América”, um dos cinco finalistas do gênero conto, na segunda edição do Prêmio Brasil/TELECOM (2004).

O autor também assinou o ensaio crítico BRENNAND – que conquistou o Prêmio Santa Rosa, da FUNARTE (1987).

Atuou também como curador da Galeria Espaço Vivo (de 1992 a 1995) e da galeria Estúdio A (de 1996 a 1998), além de ter apresentado a Exposição FRANCISCO BRENNAND, na Staatliche Kunsthale, em Berlim (1993).

No final dos anos 2000, iniciou um estudo crítico sobre a pintura de Francisco Brennand – intitulado Escrito na porta – , o qual seria publicado no primeiro semestre de 2010, com lançamento simultâneo com o filme de longa-metragem Brennand, de Mariana Fortes.

Fernando Monteiro também foi presidente da ABD-PE (Associação de Documentaristas de Pernambuco) e membro do Conselho Nacional das ABDs.

Conheça as obras (publicadas) de Fernando Monteiro:

1973: MEMÓRIA DO MAR SUBLEVADO (poesia), Editora Universitária, UFPE.

1974:  O REI PÓSTUMO (teatro), Editora Universitária, UFPE. Prêmio Othon Bezerra de Mello de Academia Pernambucana de Letras.

1981: LEILÃO SEM PENA (poesia e roteiro cinematográfico). Prêmio de Melhor Roteiro no Festival Nacional de Cinema de Aracaju.

1983: ECOMÉTRICA (poesia), Massao Ohno Editor (SP). Prêmio Nacional de Poesia (UBE/Rio).

1984: HILÉIADE (poesia), Editorial dos Reis, Portugal; A INTERROGAÇÃO DOS DIAS (poesia), Edições ENCONTRO, Gabinete Português de Leitura (PE).

1986: AKHENATON: ASCESE & REVOLUÇÃO (ensaio), Editora Expressão (SP) e BRENNAND (ensaio), Editora Spala (RJ), Prêmio FUNARTE.

1997: ASPADES, ETS ETC (romance), Campo das Letras, Porto, Portugal.

1999: A CABEÇA NO FUNDO DO ENTULHO (romance), Editora Record (RJ). Prêmio BRAVO! de Literatura.

2000: T. E. LAWRENCE: MORTE NUM ANO DE SOMBRA (ensaio). Editora Record (RJ).

2001: A MÚMIA DO ROSTO DOURADO DO RIO DE JANEIRO (romance), Editora Globo (SP).

2002: O GRAU GRAUMANN (romance), Editora Globo, São Paulo.

2003: ARMADA AMÉRICA (contos), Francis/W11 Editores (SP). Finalista do Prêmio Portugal TELECOM de Literatura/2004.

2006: AS CONFISSÕES DE LÚCIO (romance), Editora Francis (SP).

2008: O NOME DE UM HAMSTER (infanto-juvenil), Edições Bagaço (Recife).

2009: VI UMA FOTO DE ANNA AKHMÁTOVA (poesia), Fundação de Cultura Cidade do Recife.

 

Veja aqui entrevista de Fernando Monteiro para o programa Opinião Pernambuco, da TV Universitária (PE), em 4.3.2016, sobre o legado de Alberto Cavalcanti

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